(Sinto que escrevia bem melhor nesta altura... retirei este comentário de um blog que foi adicionado na lista aí do lado direito!)
Julho de 2005, resposta a um post.
Olá,vou-te dizer (escrever, apesar de ao leres ouvires na tua cabeça) que não gosto de ir a Lisboa. Acredito que o bairrismo seja algo diferente: crescer com o senhor da mercearia, a Dona não-sei-quantas que todos os dias pergunta a mesma coisa mas que se não te cruzares com ela achas estranho, o carteiro que é o mesmo há anos, a senhora que sempre teve oitenta anos que tem um quiosque que sempre teve aquele cheiro a papel seco misturado com tabaco, ... Acredito que isso seja especial... Mas penso que isso existe em todo o lado. Em terras pequenas tens essas situações e em cidades GRANDES também... em cidades grandes "médias" não tens porque como ainda estão em desenvolvimento surgem pessoas novas todos os dias, se o café não rende: trespassa-se...Mas custa-me ir a Lisboa. Se for de Expresso de Leiria, apanho uma data de velhinhas daquelas que tomam banho em perfume e que vão visitar os filhos ou netos... ou bisnetos... que vão à cidade mais multicultural do país (o algarve não conta) mas que vão o caminho todo a dizer mal dos africanos que assaltam, das brasileiras que se vendem, dos ucranianos que vêm roubar trabalho, dos toxicodependentes que arrumam carros, ... ai que o mundo é tão mau!!! E nessa viagem... leio... ou tento ler... ou adormeço... e sou acordada, como da última vez nas Caldas da Rainha, com três murros no banco, porque, mesmo encostada ao vidro, tinha "a ponta dos atacadores" a transpôr o limite virtual que separa os dois lugares do autocarro...Se estiver em Tomar vou de comboio... e apanho um grupo de jovens (outros nem tanto) trabalhadores que todos os dias vão para Lisboa... uns dormem e outros levam uma expressão no rosto que mais valia estarem a dormir... Mais uma vez... se não estiver a ler... estou a dormir... a não ser que vá com alguém amigo... aí falamos e seremos talvez os únicos sorrisos do comboio todo enquanto contamos piadas parvas para passar o tempo.Chegada a Lisboa, é quase óbvio que apanho o metro para onde quer que tenha de ir... aí é a tristeza total... será que todas aquelas pessoas têm aquela cara, que ninguém esboça um sorriso (excepto aquela senhora africana quando olho para a filha bebé e sorrio)... será que aquelas caras pesadas e soturnas se devem apenas à falta de rede nos telemóveis no metro??? ou será o ar contagiante de Lisboa, cidade onde nunca viveria mais de 2 dias???Saio do metro... após não-sei-quantas corridas no metro, não porque queira mas porque é mesmo uma "onda humana" que nos empurra... sei que já "cheiro" a Lisboa; cheiro ao comboio e ao metro, às pessoas que me rodearam... e venho à superfície respirar... uma lufada de ar fresco... agora é só ver onde ponho os pés... será que saí na saída certa do metro, ou era do outro lado? Vou perguntar, ou a um polícia ou a um taxista...ok, são só 2 kilómetros a andar, numa rua a subir, de calçada escorregadia, nem que seja pelas "poias", águas residuais, baldes despejados rua abaixo, etc...depois de o que quer que tenha ido fazer a Lisboa, o que custa é voltar... e faço o percurso contrário... mas continuo com o meu sorriso... e no metro, no comboio ou expresso, as pessoas devem pensar que não bato bem da carola... pelo menos sou "alien" porque não tenho aquela expressão de pessoa robotizada... Eu sei que são pessoas com rotinas complicadas... mas isso não as impede de ... sei lá... sorrir, meter conversa...Whatever, já estou com sono...beijinhos...
2:11 AM
Limopoca said...
Alpha mike terror amiga, entendo o que me dizes. Oiço as tuas palavras cá por dentro e sou capaz de me colocar na posição de quem nasceu na beleza, calma e simplicidade de terras onde as pessoas ainda param na rua para dizer "bom dia". Entendo e invejo, confesso.Na minha alma, ainda não consegui que fosse nítido o percurso que quero seguir na vida, se cheirar as flores do campo e saborerar os sorrisos sentidos, ou vaguear no desconhecido e no mar de rostos tristes de Lisboa.Entendo, sim.Mas digo-te que, na pele de quem aqui nasceu e que sente tudo isso que me descreveste há decadas, há magia nesta cidade sim. É desses momentos de que me falas, desse calor humano, dessa Humanidade no agir e no sentir, de que falo quando me refiro ao "meu querido bairrismo". São traços de calor e sorrisos que gentes que cá vivem há gerações, é um modo de vida que sobrevive na metrópole. E não nas ondas humanas, no murro no banco por ocupação imprópria de milímetros alheios, mas escondido nas vielas da cidade mais antiga, nas mãos e nas bocas de gentes que plantaram aqui raízes há gerações.Para mim, Lisboa é mais isso do que outra coisa, apesar de me rever em situações semelhantes às que descreveste. Lisboa é essa alma de aldeia no reboliço de antipatia, é esse pedaço que eu amo.E é triste sentir as profundas rugas de tristeza que atormentam os rostos hiper-maquilhados que por aqui vão andando, ou melhor, arrastando-se num vida sem sonhos.Raros são os sorrisos que vemos no chocalhar e guinchar do metro... a caminho do trabalho ou com outro destino qualquer. Mas amiga, sabe a céu dar um sorriso "de dentro" a um alguém assim... vazio.
1:39 AM
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